quarta-feira, 30 de março de 2011

Reticências...

Pois é. Eu já tinha desligado o computador, a luz, a televisão... Só não consegui desligar uma coisa: você. É, eu sei que é bemprovável que já tenha me desligado feito um video game que a gente joga, joga, joga e num determinado ponto, a gente enjoa e aperta "off". Acho que eu deixei de ser novidade pra você.
E já estou até me acostumando com essa ideia de ser altamente volátil, como éter destampado. Mas eu queria que soubesse que, apesar de você não ter nada a ver com o que veio antes na minha vida, eu estou cansada. Extremamente cansada. Já não aguento mais essas tsunamis de emoções que duram, no máximo, dois meses. Qual é o problema, caralho? Eu fiz alguma coisa? Ou melhor, eu faço alguma coisa pra que isso aconteça? Porque?
Estou eu cá, deitada na minha cama, com a cabeça cheia de coisas por dizer e que... simplesmente não digo. Não consigo. Não ajo. O problema sou eu? Ou o problema é você? Quem construiu esse muro entre a gente: eu ou você? Quem sentiu, pelo menos uma vez, mais saudade? Eu ou você? Quem pensou mais um no outro? Eu ou você? Peraí... já houve alguma vez eu e você? Nos meus mais íntimos pensamentos, houve. Um "eu e você" suave, como aquela maresia da praia no dia em que eu estava triste.
Houve um "eu e você" quando me olhava como um menino olha o presente de natal na manhã do dia 25 de dezembro. Houve um "eu e você" quando segurou minha mão dentro do cinema. E até mesmo quando quis competir comigo quantas fatias de pizza
seriam comidas num rodízio. Eu estava bem... eu estava leve... eu estava como há muito tempo não conseguia estar. Eu me segurei até onde pude; lembrei de você com humor e desapego. E, de repente...
É... reticências. Aliás, essa história está reticente demais. Três pontinhos doem. Doem tanto quanto olhar para você e não perceber mais aqueles olhos de surpresa. Doem tanto quanto segurar a sua mão e não sentir aquela firmeza de antes. Doem tanto quanto não ouvir mais que sentiu saudade e de me pedir para voltar logo. É o que? É um outro alguém?
E será que esse outro alguém conhece todos os contornos do seu rosto? Será que sabe que tens uma cicatriz próxima ao nariz, na bochecha direita? Será que esse outro alguém sabe que, quando dorme, seus olhos ficam meio entreabertos, dando a impressão de que está acordado? E que, quando lava o cabelo, usa boné pra ajeitá-lo? E que a sua fruta favorita é kiwi, que não tem cravo nas costas e que calça 43? Será que esse outro alguém já te viu chorar de felicidade
e te viu assumir que joga videogame muito mal?
Esse alguém já te fez um curativo? E te fez carinho nos pés com os próprios pés? E te entendeu pela sua falta de atenção... e ainda assim admirou seu grande esforço em guardar cada detalhe na memória? Esse alguém já beijou quatro numa noite, sabendo que você estava perto... mas, no final das contas, só queria você? Esse alguém lembra exatamente da roupa que estava
quando o conheceu? E te fez carinho antes de dormir? E te fez carinho ao acordar? E riu das suas tiradas... e foi vê-lo caminhar na praia... e segurou na sua mão na frente da sua família? E ouviu você dizer que queria sossegar?
Dói lembrar de tudo isso, e saber que passou rápido. Eu até poderia supor que tudo talvez tivesse um prazo de validade, mas assim, tão rápido? Achei, por um breve momento, que você ía sorrateiramente entrar na minha história como um longo capítulo, com parágrafos
bem definidos, com métricas e, quem sabe, até rimas. Não deu tempo nem de escrever a primeira página.
Você nem chegou a saber qual era a minha comida favorita, quais eram os meus sonhos, se eu era organizada ou desorganizada. Você sequer chegou a saber se eu ando de chinelo ou descalça em casa... E como eu fico desconsertada quando canto. Não sabe que prefiro pintar as unhas de vermelho e que escolho as roupas que uso pra te agradar.
Hoje tentei agir diferente pra ver se, de fato, me conheço tanto quanto gostaria. Andei de chinelos em casa, deixei minhas roupas bagunçadas, tomei açaí com a mão esquerda, usei um sapato que há nove meses não usava. Até usar as meias até o meio da panturrilha usei, apesar de achar ridículo ir malhar assim. Estranhei quando, antes de deitar, lavei o rosto e me deparei com aqueles olhos verdes tristes... tristes em saber que não pude dividir nada disso com voce. Triste em saber que passou... evaporou.
É uma pena, garoto... Uma pena que não tenha se dado a chance de viver ao lado de alguém que poderia lhe trazer tanta coisa boa. Sem modéstias mesmo! Alguém que seria sua amiga... sua companheira... sua mais louca amante. Alguém que, com certeza, te acrescentaria. Não somente pelo o que ela é... mas pelo o que ela teria sido pra você. E agora, depois das idiotas expectativas, eu fico assim... chorosa... sozinha. Ah...porque ainda tem isso, né? Eu estou completamente sozinha. Na verdade, não... sejamos justos... estou comigo mesma. Hum... teria sido... éérh... teria sido... acho que não tem uma palavra pra descrever o que teria sido. É isso... teria sido. Ponto.
Mas não esquente a cabeça... até porque estou tentando esfriar a minha. Você vai passar... você também vai passar. Assim como vários outros passaram. Com você achei que seria diferente. Mais uma vez me enganei. E chega de lamúrias. Cada um tem sua escolha a ser feita. Você fez a sua e eu, a minha. E eu escolho cuidar de mim. Infelizmente não tenho o botão "RESET" pra apagar todas as lembranças. O único botão que ainda tenho é o botão de rosa que você me deu, guardado dentro da minha agenda.
Estou enjoada deste jogo. Então... acho que está na hora de clicar no botao "off". E dar, de uma vez por todas, game over nessa saudade que não cabe no peito. Um dia, essa saudade escapa... esvai... se torna volátil... como éter... como nós.